Aviação Comercial
(ou o paradoxo da “variável constante”)
Foi publicado o relatório final da task force que analisou o acidente Germanwings 9525. Confesso que após a última conferencia da ECA, há cerca de um mês, aquilo que muito provavelmente constaria neste relatório, era já do meu conhecimento, embora, evidentemente, de forma oficiosa e sigilosa. Ainda assim, o resultado do relatório em quase nada me surpreende, antes pelo contrário, mas retenho três das recomendações:
- Manter a recomendação, em oposição da obrigatoriedade, da chamada regra dos quatro-olhos-no-cockpit, agora chamada de 2-pessoas-no-cockpit – exactamente aquilo que a APPLA, à altura, recomendou ao INAC, tendo o Instituto optado, pela obrigatoriedade, algo que se revela como praticamente impossível de executar em muitos voos, em especial devido ao impacto que causa no serviço aos passageiros.
- Rever o impacto e oportunidade da recomendação da regra das 2-pessoas-no-cockpit dentro de um ano - exactamente aquilo que a APPLA, à altura, também recomendou ao INAC.
- Estabelecer um programa robusto de supervisão (oversight) à prática dos AMEs – Aeronautical Medical Examiners. Estando nós, de acordo com o SMS – Safety Management System, no que concerne à Segurança Aeronáutica, na era dos Factores Organizacionais, em que se deve ter todo o sistema como o responsável principal por aquilo que de bem e de mal possa acontecer, decide a task force incidir o foco exactamente nas pessoas (médicos) que examinam os Pilotos.
Na realidade, o que aconteceu no Germanwings 9525 foi uma infelicidade eventualmente evitável, mas que parece ter posto a nu falhas enormes no sistema alemão de exames médicos dos Pilotos. A pergunta é: que resultado positivo se espera obter, seja em que vertente for, através da supervisão dos AMEs As respostas parecem por demais evidentes, mas em vez de se preocupar com o sistema e com resultados que claramente parecem apontar para algo sistémico, esta task force, onde os Pilotos estiveram representados pela ECA (talvez razão pela qual o resultado não fosse ainda mais estranho), decide concentrar a maioria das suas recomendações sobre profissionais (Pilotos e Médicos), como se os mesmos actuassem à margem do sistema, o qual, pasme-se, é regulamentado pela EASA. Ou será que temos a EASA cada vez mais como o braço político da Comissão Europeia Estou já a imaginar uma recomendação de 2-pessoas-no-gabinete-médico dos AMEs!
No entanto, o Germanwings 9525 e o relatório da task force trouxeram a discussão de um importante factor, que começa a ser um flagelo na sociedade: o stress em excesso, que é um dos principais factores que conduz à depressão, doença que, ao que sabemos, afectou por várias vezes o Co-Piloto do malogrado voo.
Com enorme sentido de oportunidade, numa busca incansável de apurar factos e de esclarecer os leitores, a Sirius foi até ao Algarve entrevistar Andrew Vincent, Director do Centro de Recuperação Nova Vida, onde se recuperam pessoas que sofrem de stress e do consumo de substâncias. Andrew, que foi também a escolha da BBC para procurar entender o fenómeno, dá-nos a saber que até à data apenas foram tratados Pilotos estrangeiros no seu centro, que não é necessário ser-se alcoólico para se ter um problema com o álcool e que o stress, embora desejável e presente de forma transversal na sociedade, quando em excesso é uma das principaiscausas da depressão, sendo ainda um factor que deve ser visto de forma muito diferente e especial no que concerne aos Pilotos. É uma entrevista e peça jornalística de primeira categoria, da autoria de José Manuel, arrepiante em algumas revelações, que considero leitura obrigatória para qualquer Piloto profissional e responsáveis máximos das empresas de aviação, em que sérios alertas são feitos ao sector.
Outro destaque desta edição da Sirius, que temos também como leitura obrigatória, é a primeira grande entrevista concedida pelo Presidente da Direcção do SPAC, David Paes, recentemente eleito, a qual dá mote para a possível estratégia a seguir pelo Sindicato dos Pilotos.
Chamo ainda a vossa atenção para duas rubricas novas: “A Voz dos Pilotos“, cujo título escusa apresentações, e que publicamos na página 26 desta edição, e “As citações da Aviação“, através da qual trazemos aos nossos Estimados Leitores as frases mais marcantes da actualidade aeronáutica e também alguns pensamentos escritos na língua universal da aviação.
A equipa actual da Sirius magazine está em busca constante pela melhoria da sua revista predileta de aviação. Neste sentido, e para que se consiga quebrar um pouco a rotina de leitura, alterámos o formato de publicação dos artigos na Sirius magazine, desejando que esta mudança seja do agrado de todos os nossos Leitores.
Boas descolagens, melhores aterragens e, “no cruzeiro da vida”, que a Sirius magazine seja a vossa leitura e orientação.